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  • Observatório do Espaço Público

o
espaço
público
das
ruas

brasileiras

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sobre o projeto

SENTIDO
 

O espaço público tem adquirido cada vez mais relevância entre estudiosos, gestores e investidores do espaço urbano. Dentre tantas, duas manifestações atuais permitem vislumbrar o potencial desse interesse: a instituição do Prêmio Europeu para Espaços Públicos Urbanos, que desde 2000 já laureou mais de 300 experiências naquele continente, e a particular atenção que a UN-HABITAT dispendeu ao tema na Conferência Habitat III de 2016, a ponto de transformá-lo em importante questão dentro da Nova Agenda Urbana. De fato, é inevitável abordar o espaço público para se compreender a vida na cidade contemporânea.

Para arquitetos e urbanistas conscientes da diversidade e complexidade dos ambientes urbanos e compromissados com os desafios que a profissão encerra, constitui-se tarefa imperiosa a constante reflexão acerca dos múltiplos temas concernentes ao espaço público, que por sua vez, conformam a paisagem urbana, tais como segurança, proteção, conforto, mobilidade, acessibilidade, arborização, comunicação visual, mobiliário urbano, infraestrutura urbana, comércio formal e informal, interação entre arquitetura e espaço livre, planejamento, gestão e manutenção, aspectos técnicos e estéticos, dentre tantos. Tal é o desafio a que se propôs essa exposição fotográfica, que sintetiza o cotidiano do espaço público das ruas de metrópoles brasileiras.

significados
 

O espaço público é uma categoria que tem sido analisada por distintos campos disciplinares, situação que, muitas vezes, gera atritos de compreensão, constituindo-se em “campo semântico especialmente instável”. Por um lado, considerando a dualidade público-privado, uma primeira indicação sobre o alcance desse conceito advém do que assegura a jurisprudência, ou seja, um corpo legal que sustenta a existência de formas de propriedade imóvel. Sem dúvida, trata-se de uma definição restritiva, pois se vincula a um limite territorial, mas que aponta para garantias essenciais do cidadão, muitas vezes não respeitadas. De outra perspectiva, ao se ultrapassar as barreiras físicas e incorporar uma dimensão sociopolítica, o espaço público também pode ser entendido como lócus de interação social, de trocas, de encontros, de coexistência e de vivências múltiplas, fundamentais à vida urbana. Nessa esfera, aglutina-se a transformação que as redes sociais têm propiciado para o processo de consolidação da cidadania e da democracia, como um “novo espaço público”. Portanto, para que continue como elemento essencial do espaço urbano na cidade ocidental, a ponto de ser impossível imaginá-la sem a sua existência, o espaço público deve ser entendido em uma “perspectiva integrada”, incorporando essas duas dimensões: seria um lugar no sentido “material” e “imaterial”.

enfoque
 

Convida-se para uma reflexão comparativa acerca dos atributos físicos e sensoriais primordiais, dos usos, ocupações e apropriações cotidianos com a finalidade de compreender como os aspectos triviais e inusitados, os desajustes e os conflitos caracterizam o espaço público na metrópole brasileira. Um primeiro alerta: foi opção deliberada expor as dificuldades e ocultar as generosidades, que existem, mas são muito infrequentes e fragmentadas. Talvez, seja esse o quadro generalizado, já que a cidade brasileira do limiar do século XXI, como suas congêneres dos séculos anteriores, materializa em seus espaços públicos as estruturas socioeconômicas vigentes e os conflitos socioespaciais em andamento. Assim, tem-se configurado uma forma urbana resultante direta do padrão excludente dos processos de desenvolvimento, planejamento e gestão do território, nos quais irregularidades, informalidades e ilegalidades não se constituem como exceções, mas sim como regra geral.

escolhas

 

Com a finalidade de construir um quadro representativo da cidade brasileira, selecionou-se oito municípios, sedes de suas respectivas regiões metropolitanas assim considerados como “metrópoles de segundo nível”: Belém, Belo Horizonte, Curitiba, Fortaleza, Goiânia, Manaus, Porto Alegre, Recife e Salvador. Nessas regiões metropolitanas, residiriam quase 30 milhões de pessoas, atingindo por volta de 15% da população nacional, de acordo com o censo de 2010; já para as metrópoles, pelo mesmo recenseamento, residiriam mais de 17 milhões de pessoas, total também expressivo frente ao cenário nacional. E, para além desse aspecto quantitativo, as metrópoles, por seu dinamismo socioeconômico e cultural, constituem-se em espacialidades com alto grau de ressonância na rede urbana nacional. Todas foram visitadas durante o ano de 2015, quando se percorreu mais de 350 quilômetros à pé.

E por que ruas? Nos últimos anos, as questões em torno das atribuições desse tipo de espaço público têm passado por renovado ciclo de debate. E ainda que seja um empreendimento discursivo que se verifica há décadas no Brasil, entende-se que as ruas têm perdido seu papel histórico de elemento aglutinador da esfera pública para se transformarem em eixos de deslocamento, sobretudo de veículos automotores, apequenando-se socialmente. Ademais, em função de sua proeminência quantitativa no quadro físico das aglomerações, constituindo o “esqueleto da cidade”, e de sua essência como principal palco para o exercício da vida pública cotidiana, as ruas são estratégicas para captar os avanços e as deficiências de uma dada sociedade, nem sempre perceptíveis ao olhar desatento.

Por fim, com o objetivo de equilibrar a análise comparativa, adotou-se os centros urbanos como locais de investigação. Certamente, essas áreas apresentam um conjunto de situações que se conectam com o acelerado processo de urbanização da sociedade brasileira. Por um lado, os investimentos consolidados em edificações, equipamentos, infraestrutura, mobiliário urbano, etc., por agentes públicos e privados, em conjunto com as atividades econômicas e as práticas cotidianas que ali se desenvolvem, caracterizam o centro urbano como uma especial construção coletiva que toma forma num longo e intrincado processo histórico. Plena de valor simbólico (cultural e histórico) e socioeconômico (político e imobiliário), essa área adquire vários significados que juntos dão sentido à vida urbana de uma certa coletividade. Portanto, constituindo-se como um local de referência urbana, apresenta usos e atividades diversificados e polariza fluxos de pessoas, mercadorias e informação que são fundamentais para a cidade e sua região, quando não nacionalmente. Contudo, mesmo diante dessa relevância, a dinâmica urbana da cidade brasileira – ou propriamente da cidade capitalista – afeta a área central com processos socioespaciais que acabam por fragilizá-la em várias dimensões. Ainda que cada conjunto centro-cidade guarde suas idiossincrasias, exibindo importantes especificidades, essencialmente, a concorrência com outros lugares produzidos pela expansão horizontal e vertical determina sua drástica transformação: a evasão de residentes, atividades e funções originais cedem lugar a uma reocupação que, por desinteresse público e privado, canaliza um processo de degradação física - infraestrutura, mobiliário, edificações, ou seja, das propriedades privadas e do próprio espaço público - e de acirramento social, com a revelação explícita das profundas diferenças presentes em nossa sociedade. Configuram-se, assim, em local privilegiado de observação da cidade brasileira. Segundo alerta, entretanto: os achados sobre a metrópole de Curitiba não estão expostos. Escolha que oferece o convite à reflexão da cidade que se tem e que se quer ter.

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